PARCERIAS
Nos trilhos de uma antiga ferrovia o blues segue sua jornada de metáforas sobre o deslocamento diante do mundo e o desejo pela liberdade. Percorre seu caminho como crônicas autobiográficas de um solitário que dedilha sua catástrofe pessoal e versa sobre vidas, atores e histórias invisíveis. É como um estado de espírito em que notas rebeldes se distorcem com sarcasmo, sempre meio tom abaixo, a fim de desrespeitar os códigos ocidentais da musicalidade, resgatando para si uma sensibilidade ancestral refinada.
Bluesistas embriagam-se do desejo de escapar entre gemidos, sussurros e ruídos. O assobio da gaita revela as notas de passagem onde o prazer encontra a fugacidade. Ao se expressar com naturalidade recriam o prazer negado e ressignificam o trauma, imergindo na melancolia para transmutar a dor em ritmo que dá sentido ao corpo e à vida.
Em FUGA, Angela Brito incorpora à sua alfaiataria reformulada essa forma despretensiosa de viver a vida. A coleção caminha como a improvisação do blues: peças em shapes desalinhados, que variam entre formas, silhuetas e looks compostos por múltiplas camadas irregulares de sobreposições herméticas. Pela primeira vez Angela explora a sinestesia das cores ao revelar as pinceladas do dia e da noite, caindo em tons saturados até nuances frias. As estampas ligadas ao campo silvestre exprimem o lugar onde a vida nasce. O ideal de esperança que germina na candura e no futuro retorno de ser em essência.